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Umas lembranças de uma época

  • por

Luís Augusto Fischer

Maio de 2023

Eu acompanhava de longe a Associação Gaúcha de Escritores, creio que desde sua fundação, em 1981. Nunca havia me aproximado porque (pode isso parecer agora uma bobagem) não me considerava um escritor. Embora relativamente próximo do tempo atual, aquele período ainda reservava essa designação para quem publicava livros, e não quaisquer livros, mas aqueles de criação – narrativa, poesia, teatro, crônica. 

Eu publicara meus primeiros livros solo, sempre no campo da crítica e do estudo de literatura, em 1989 e 1992. Mas em 1996 publiquei um livro de contos, O edifício do lado da sombra, pela Artes e Ofícios, numa edição peculiaríssima que tinha a companhia de outro livro, Sal na pedra, poesias, do Luciano Alabarse. Um mesmo volume, mas com dois registros de ISBN, num formato que foi sugerido pelo Luciano, meio que imitando um livro do João Silvério Trevisan daqueles anos, O livro do avesso, que tinha uma história começando por uma das capas, e outra começando pela outra. 

Enfim, em 96 passei a considerar que eu também era escritor e então me pareceu que podia passar a integrar a Associação Gaúcha de Escritores. Hoje esse conceito está muito mais largo, mais abrangente (o sujeito publica alguma crônica e já se considera um escritor), o que me parece ok. Mas naquele momento era diferente. 

Entre 1993 e 1996 eu trabalhei na Secretaria de Cultura de Porto Alegre, na coordenação do Livro e da Literatura, como se chamava então. Era uma posição de criação recente ainda – o primeiro a ocupá-la foi Arnaldo Campos, quando Joaquim Felizardo criou a Secretaria de Cultura na cidade, em 1988, e o segundo foi Fernando Schuler, sob o secretário Luiz Paulo de Pilla Vares, que permaneceu secretário por um tempo, sendo sucedido pela Margarete Moraes, no tempo em que eu ocupei o cargo. Depois de mim entrou Charles Kiefer., depois outros colegas; hoje está lá Sergius Gonzaga. 

Naquele momento, eu tive forte contato com o campo do livro e da literatura em geral, suas instituições e atividades, e com os escritores em particular. Aquele governo (o prefeito era Tarso Genro) foi muito apoiador da cultura, e nossa tarefa era a de fazer mediações entre os profissionais da área e a máquina da prefeitura, assim como com o Orçamento Participativo, que ganhava tração naqueles anos. Tivemos uma interação muito significativa com a Câmara Riograndense do Livro, especialmente na gestão comandada por Júlio Zanotta Vieira.

Assim que terminou aquela gestão na prefeitura, eu retornei para a minha condição de professor, no Instituto de Letras da UFRGS, mas mantive uma proximidade grande com o trabalho no campo profissional do livro. Foi nesse contexto que armamos uma nova diretoria para a AGES, que estava praticamente parada, sem atividade por aqueles anos. A nominata de nossa direção, para os anos de 1997 e 98, era composta por Dilan Camargo como secretário, e um conselho composto por Moacyr Scliar, Vera Ione Molina, Dorothy Camargo Gallo e Jaime Cimenti, e eu como presidente. Esse mandato foi renovado para o biênio seguinte; mas neste segundo momento mais uma vez a Associação perdeu fôlego.  

Não foi uma gestão muito forte em atuação, por motivos variados, que nem sei se conseguiria apreciar adequadamente. Para dar um exemplo concreto: naquele momento, os computadores de uso pessoal ainda eram relativamente escassos, e a internet engatinhava. Estávamos ainda muito longe das redes sociais atuais, e o smartphone era uma coisa impensável. Isso significa concretamente que os contatos se davam ainda por telefone ou carta, que agora nos parecem coisa de uma lentidão insuportável. 

De todo modo, algumas coisas foram feitas. Os documentos que aqui são reproduzidos mostram que em 97 e 98 fizemos encontros bastante fortes na Feira do Livro de Porto Alegre, com algumas dezenas de presentes, debatendo temas do momento. Deveríamos ter feito cadastro dos filiados e tomado outras providências administrativas, mas nada prosperou nessa direção. 

Na Feira do 1997, a AGES, então sem o S (a Associação era apenas AGE para nós todos, situação que mudou com a entrada em cena da editora que tem essa mesma sigla), participamos de uma atividade interessante e vibrante, para os padrões da época: a Xerox ofereceu à Câmara do Livro a possibilidade de imprimir livros (em qualidade que agora se reconhece como precária, com páginas apenas coladas, capas sem orelhas, etc.), na promoção que se chamou “Autor do dia”: a cada dia, um desses livros foi lançado, com direito a autógrafo. A Prefeitura de Porto Alegre, via Secretaria de Cultura, teve participação decisiva e assinava a publicação conjuntamente. (Ver imagens)

A nominata foi a seguinte, com as respetivas datas de lançamento, entre 3 e 15 novembro – três deles foram organizados pela nossa Associação e aparecem em negrito na tabela abaixo:

DIATÍTULOAUTOR
A barata de togaGuilherme Verzoni
4No cone das horasPaulo Strelzuk
5O sol de agostoMarcel Citro
Domingo de futebol e outros poemasMarlon Almeida
7As vinhas da liraEduardo Dall’Alba
8Crônica & CidadeAssociação Gaúcha de Escritores
10No outro lado da ponteVera Ione Molina
11Antes de partir revelarei meu amor por ti na última fraseCristine Zancani
12Paisagem demasiado intensaPaulo de Tarso Riccordi
13ParusiaDogival Duarte
14Poesia & CidadeAssociação Gaúcha de Escritores
15Conto & CidadeAssociação Gaúcha de Escritores

O volume de crônicas foi organizado pela Ivette Brandalise e teve os seguintes participantes: a Ivette mesmo, Antônio Hohlfeldt, Arnaldo Campos, Dorothy Camargo Gallo, Ivo Bender, Jaime Cimenti, José Guaraci Fraga, Juarez Fonseca, Kenny Braga, Liberato Vieira da Cunha, Luis Fernando Verissimo, Luiz Antonio de Assis Brasil, Lya Luft, Moacyr Scliar, Nilson Luiz de Souza, Patrícia Bins, Paulo Bentancur, Paulo Sant’Anna, Roberto Gigante, Sérgio Agra, Sérgio da Costa Franco, Sérgio Jockymann, Sérgio Napp, Tabajara Rusa, Valesca de Assis e Walter Galvani.

O volume de contos, organizado por mim, contou com textos de Aldyr Garcia Schlee, Amilcar Bettega Barbosa, Arnaldo Campos, Cíntia Moscovich, Dorothy Camargo Gallo, Fernando Neubarth, Jaime Cimenti, Jane Tutikian, Jerônimo Teixeira, José Carlos Laitano, José Eduardo Degrazia, Laury Maciel, Max Mallmann, Moacyr Scliar, Paulo Bentancur, Paulo Ribeiro, Sérgio Napp, Tania Jamardo Faillace e Walmor Santos. 

O volume de poesia foi organizado pelo Dilan Camargo, com textos de Nelson Fachinelli, César Pereira, Landro Oviedo, Paulo Hecker Filho, José Eduardo Degrazia, Luiz Coronel, Donald Schüler, dois Santos dos Santos, Maria Dinorah, Marô Barbieri, Maria Carpi,  Paulo Roberto do Carmo, Lya Luft, Armindo Trevisan, Carlos Nejar, João Ângelo Salvadori, Silvestrin Roberto, Liana Timm, Jaime Vaz Brasil, Ricardo Silvestrin, Luiz de Miranda, Ary Nicodemos Tretin, Silvio Duncan, Mario Pirata, Sergio Napp, Fernando Castro, Orlando Fonseca, Vitor Biasoli, Humberto Zanata, Prado Veppo, Haroldo Ferreira, Paulo Seben, Jayme Paviani, Carlos Urbim, Tarso Genro, Martha Medeiros, Itálico Marcon, Dilan D’Ornellas Camargo, Isssac Starosta, Paulo Bentancur, Ricardo Portugal, Oliveira Silveira e Julio Machado da Silva Filho.

(A gente lê essas nominatas e fica relembrando uns quantos colegas que já se foram. Puxa vida.)

Ainda ao final de 1998 a AGES teve outra atividade muito interessante – fizemos o que foi chamado de 1º Encontro de Escritores – Canela-RS, por ocasião da 11ª Feira do Livro Josué Guimarães e Mostra do Jovem Escritor Canelense. A prefeitura nos ofereceu pouso e comida, para um final de semana, e foi uma linda oportunidade. Lembro em especial a alegria de Barbosa Lessa em participar – ele se considerava um escritor (e de fato contava com uma série de obras de grande criatividade, desde sua juventude) e ficou feliz em ser convidado, especialmente porque, creio que disse isso em público, só era lembrado como folclorista e criador do 35 CTG…

No ano seguinte ainda fizemos algum esforço para encontrar um rumo adequado para a Associação, mas de fato não tivemos bom êxito. De todo modo, creio que conseguimos passar adiante o bastão, nessa corrida de revezamento que agora encontra um momento de grande felicidade, com a direção nova.