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A CRIAÇÃO DA ASSOCIAÇÃO GAÚCHA DE ESCRITORES

  • por

 José Eduardo Degrazia

          No início dos anos 70 vivíamos tempos muito difíceis de repressão e endurecimento do regime militar. A repressão e a censura eram da ordem do dia. O que levava a que os movimentos culturais, diretamente atingidos por isso, procurassem alternativas. Formou-se assim o Grupo Vereda de Edições Cooperativadas, que reuniu um grupo de escritores que eram contra o regime, mas, ao mesmo tempo, estavam preocupados em encontrar novas formas de edição para os seus trabalhos. Esse grupo, inicialmente, era composto por Selvino Heck, Umberto Sudbrack. e eu.  Depois acrescido por nomes como Sergio Faraco, Aldyr Schlee, e outros. Ao mesmo tempo, havia um outro grupo que pretendia fazer uma cooperativa de escritores aos moldes da dos jornalistas, de que participavam Dilan Camargo, Carlos Carvalho e Humberto Zanatta.  O Jaime Cimenti participava de outro grupo, Cooescritores. Eram tempos difíceis, mas de muita criatividade, onde escritores consagrados como Moacyr Scliar, Mario Quintana, Donaldo Schüler se interessaram em participar do movimento. Os jovens faziam a propaganda e procuravam chamar novos e antigos escritores a participar do movimento. Foram lançadas, na época, muitas antologias de escritores jovens, que tinham o apoio de escritores mais velhos. E o apelo foi muito bem recebido por grande número de intelectuais da Porto Alegre e do interior, é só pesquisar as matérias que saíram no período em jornais de Porto Alegre e do interior.

          Os encontros eram feitos no Clube de Cultura e encontraram repercussão em escritores que ocupavam cargos importantes (ou depois ocupariam) nas entidades de cultura, como Assis Brasil e Luiz de Miranda. Também, os encontros aconteceram no Centro Municipal de Cultura, na Casa de Cultura Mario Quintana, e papéis importantes tiveram nessa organização, já no início dos anos 80, Tarso Genro, Jaime Cimenti, e Rossyr Berny. Lembro que se discutia se o melhor era fazer um sindicato ou uma associação, tendo prevalecido a última proposta. O importante era que fizéssemos uma entidade que fosse representativa dos escritores e que lutasse por direitos em relação às editoras, e fosse, ao mesmo tempo, defensora da democracia. Interessante notar é que, politicamente, a maior parte dos escritores ativistas faziam parte do MDB e do PDT. Mas não havia politização partidária no movimento. Todos os que eram contra a ditadura eram benvindos. E, me parece, que esta abertura até hoje se mantém, com o não atrelamento da entidade a nenhum partido. 

          Lembro que a reunião que criou a AGES, no centro municipal de cultura, no ano de 1981, teve o trabalho incansável de Jaime Cimenti, Carlos Carvalho, Dilan Camargo, Tarso Genro, Zanatta, e outros. Assis Brasil e Donaldo Schüler eram pessoas presentes, que davam o aval de sua já consagrada maturidade literária àquele movimento de jovens escritores. É importante ressaltar a figura de Antônio Holfeldt (também um dos fundadores) que no Correio do Povo repercutia todos esses movimentos.

          Lembro que naquele encontro de inauguração da AGES, depois de discursos e conversas, aconteceu uma demora para se tomar a decisão de assinar a ata de criação da entidade. Foi aí que levantei, para dar motivação aos outros, e a assinei. Parece que o meu nome consta como o primeiro a ter assinado. Foi por um impulso, mas também com a intenção de que todos os presentes a assinassem.

          Tendo sido um dos fundadores da AGES, devo dizer que pouco participei de suas direções, a não ser na presidência do Walmor Santos (1999-2001), em que fui secretário. Já não tínhamos sede própria, e nos reuníamos em bares e cafés, em geral no final da tarde. Eu carregava a pasta com toda história da associação de um lado para o outro, e a minha preocupação maior era com a ata original de criação da entidade; tida por muitos como perdida, estava ali, sã e salva. Foi com grande alívio que passei adiante a pasta para a seguinte diretoria, e passei a cobrar que ela fosse reproduzida – já estávamos entrando em pleno domínio da internet que tornava isso mais fácil –, e foi aí que o Luiz Paulo Faccioli passou a chamá-la de santo graal, de tanto que a mencionavam e procuravam. Ele a manteve e, segundo consta, foi na gestão de Caio Ritter que foi digitalizada e tornada disponível. Ali estão os nomes de todos os pioneiros, mulheres e homens escritores que a criaram.

          É muito confortador ver que a entidade, através desses mais de quarenta anos de existência, continua firme, carregando a bandeira dos seus ideais, pela cultura, pela literatura e pela democracia.